O Tether surgiu como uma criptomoeda com valor ancorado ao dólar – mas segue sendo conhecida mais por suas polêmicas.
Você provavelmente já ouviu falar do Tether, afinal, essa moeda subiu para a décima primeira posição em capitalização de mercado poucos meses após seu lançamento, e, quando todas as outras estavam em declínio, causando uma queda na capitalização de mercado geral das criptomoedas, ela estava crescendo. Logo, no começo do ano, só se falava nela.
Capitalização de mercado do Tether em 1 ano
Fonte: coinmarketcap.com
Atualmente, o valor da moeda é de 1 dólar. E será sempre esse. Esse é exatamente o objetivo dela: estar ancorada (“tethered”) à moeda americana.
É importante ressaltar a relevância dessa ideia. É muito mais fácil, para vendedores que quiserem oferecer seus produtos em criptomoedas, fazerem isso com um preço “reconhecível” pelo usuário. Poucas pessoas têm noção de proporção em relação ao Bitcoin – e muito menos das altcoins.
Mas, além dessas, existem outras aplicações realmente valiosas para uma criptomoeda com essa característica. Uma muito interessante e que tem sido muito utilizada é a de servir como medida de comparação com o dólar em corretoras para que o usuário saiba o valor das criptomoedas em relação ao dólar. Enquanto é extremamente raro altcoins sendo vendidas por fiat (dinheiro “não-digital”) em Exchanges, por questões judiciais, principalmente, o preço pode ser relacionado com o seu preço de venda em relação ao USDT, que vai valer sempre 1 dólar. Isso tem facilitado trocas que deixam de usar Bitcoin como “middle currency”, passando a usar o USDT, além de, principalmente, facilitar análises de dados, pois, com essa moeda corrente em plataformas de negociação, é possível analisar melhor a evolução das criptomoedas em relação ao dólar, considerando que as maiores corretoras possuem pares de venda/compra de USDT com altcoins.
Através do protocolo Omni, o Tether funciona dentro da Blockchain do Bitcoin. Logo, pode-se esperar que suas potencialidades e defeitos, tecnologicamente, sejam idênticos a esse.
Todo USDT (Tether) em circulação possui um USD (dólar) em reserva pela empresa Tether Limited, e pode ser sacado a qualquer momento pela plataforma deles. Logo, parece uma forma genial de guardar seus dólares em um banco digital e mantê-los anônimos e seguros, além de facilmente intercambiáveis por qualquer outra criptomoeda. Bem, ao menos isso é o que a empresa alega, e é justamente daí que vem a maior parte da controvérsia em relação ao Tether.
Tão interessante quanto a ideia por trás da criptomoeda é toda polêmica que a cerca, muita parte já coberta pelo BTCSoul em detalhes em artigos separados, aqui. Para que essa funcionalidade do parágrafo acima dê certo, é claro, é preciso que se tenha certeza que a empresa realmente cumpre o que promete, ou seja, que possui em reserva realmente uma quantidade igual ou maior do que a quantidade de USDT em circulação, em dólares. Há um histórico de tentativas e promessas de auditorias para verificar se isso acontece mesmo: ano passado, uma auditoria foi feita e publicada. Algumas pessoas notaram, no entanto, um detalhe importante no documento apresentado como prova, uma auditoria assinata pela empresa de contabilidade Friedman LLP. Ele constava a seguinte frase (em tradução livre): “o presente documento é apenas para usufruto da empresa Tether Limited. Não foi feito para que e não deve ser usado ou confiado por nenhum terceiro”. Uma segunda “prova”, em junho de 2018, foi postada em seu site – um documento provando a auditoria do escritório jurídico Freeh, Sporkin & Sullivan LLP (FSS). O escritório, após ser questionado sobre o documento, respondeu que “não é uma empresa de contabilidade e que o proceesso não havia sido feito com os padrões exigidos para uma audição oficial e que, portanto, não podem ser considerados resultados oficiais”. Desde então, apesar de garantirem ser uma empresa transparente, ainda não conseguiram mostrar uma prova consistente de suas afirmações.
A polêmica não para por aí: o Tether foi criado pelos mesmos fundadores de uma das maiores Exchanges do mundo, a Bitfinex, que é acusada de ter usado o Tether para inflar artificialmente o preço do Bitcoin ano passado. Um estudo científico do padrão das transações do Bitcoin e do Tether, na verdade, concluiu que nada menos que 50% do boom do Bitcoin de 2017 tenha sido resultado de manipulação de preços utilizando o Tether. A Bitfinex era a corretora responsável por “emitir” os USDT.
Como se não fosse o suficiente, em novembro de 2017, um erro na rede fez com que US$31 milhoes de USDT fossem roubados. Depois disso, houve um hardfork na Blockchain e um novo algoritmo foi implementado. Os tokens roubados foram identificados e bloqueados de serem transferidos. No mesmo ano, houve alguns casos de pedidos de saque que a empresa não conseguiu atender.
Apesar de tudo isso, o Tether segue firme na décima primeira posição em capitalização de mercado. O seu valor às vezes dá uma balançada leve, mas segue não divergindo mais do que a terceira casa decimal de 1USD, e é isso que importa. Por conta dessa característica, já é adotada como moeda de troca entre altcoins não só pela Bitfinex, mas por boa parte das Exchanges. A mesma empresa tem planos de lançar criptomoedas similares, ancoradas a outras moedas correntes de países. O JPY (iene japonês), pelas informações do site, provavelmente é a próxima.
Carlos Eduardo é um engenheiro frustrado que, ao decidir investir em criptomoedas e estudar o mercado, decidiu que gostava mais disso que do investimento em si. Já trabalhou como consultor para criptomoedas atualmente no top 100, dApps e publica periodicamente em revistas americanas e, aqui no Brasil, na BTCSoul. Acredita que a adoção geral de uma Smart Economy resolveria boa parte dos problemas do mundo.